Fratura da coluna cervical

Cirurgião da coluna em São Paulo

Entenda o que é a fratura da coluna cervical

As lesões da coluna cervical estão entre as lesões musculoesqueléticas mais devastadoras. Em geral, os pacientes são vítimas de traumas de alta energia, sendo predominantemente jovens. Dessa forma, o atendimento ideal começa ainda no local do acidente com imobilização cuidadosa da coluna cervical e transporte adequado do paciente a um pronto-socorro. Órteses cervicais adequadas para o transporte inicial fazem parte da rotina das equipes que prestam socorro "in loco", além de fazer parte do primeiro item de atendimento no pronto-socorro. O ATLS (suporte avançado de vida no trauma) preconiza o atendimento em etapas, sendo que a primeira etapa consiste na verificação de uma via aérea pérvia e colocação de colar cervical quando este não está presente. A finalidade desses procedimentos é evitar a ocorrência ou agravamento de uma lesão medular.


A realização do "ABC" (vias aéreas, ventilação e circulação) e os procedimentos iniciais para manutenção da vida devem ser executados sem que a coluna cervical seja descuidada. Mobilização em bloco do paciente e intubação cuidadosa devem ser realizadas.


As lesões da coluna cervical podem ser divididas com respeito à sua localização em lesões da coluna cervical alta e baixa. As lesões altas são aquelas que acometem o occipício e a primeira ou segunda vértebras cervicais, enquanto as lesões baixas são aquelas que ocorrem entre a terceira e a sétima vértebras.


História e exame físico 

Frequentemente, estaremos diante de um paciente politraumatizado e com diminuição do nível de consciência. Com isso, a obtenção de dados acerca do trauma torna-se difícil. Uma avaliação do paciente por uma equipe multidisciplinar com experiência no atendimento desse paciente é fundamental. Dessa forma, lesões que colocam a vida do paciente em risco devem ser prontamente tratadas.


Já o paciente que se encontra consciente, a tarefa de obter informações sobre o trauma é mais fácil. Informações sobre quedas, colisões automobilísticas, ferimentos por armas de fogo e tantas outras quanto forem obtidas auxiliam o médico a quantificar a gravidade das lesões.


Dor cervical, edema local ou desalinhamento dos processos espinhosos à palpação são dados importantes e devem ser pesquisados. Desvios rotacionais e edemas cervicais anteriores também podem representar lesões graves da coluna cervical. Além disso, escoriações e equimoses (manchas roxas na pele) na face podem ser o resultado de um impacto direto sobre esse local com possíveis repercussões na coluna.


O exame físico neurológico deve ser executado no paciente alerta e acordado. Testes motores, sensitivos e dos reflexos devem ser incluídos neste exame.


Exames de imagem 

A radiografia simples da coluna cervical em 3 posições: lateral, anteroposterior e transoral, constitui o exame inicial e é capaz de detectar de 83 a 99% das lesões. 


Radiografias oblíquas têm pouco valor para a avaliação inicial do paciente politraumatizado e não devem ser solicitadas. Para que a radiografia seja considerada adequada, é imprescindível que toda a coluna cervical, incluindo a transição entre a 7ª vértebra cervical e a primeira vértebra torácica, esteja contida no exame. Esta região pode estar sobreposta ao ombro, o que torna sua visualização difícil. Por isso, manobras como tração dos membros superiores ou radiografia na posição do nadador são obtidas no intuito de eliminar esta sobreposição.


As estruturas que devem ser observadas na radiografia em perfil são: espaço retrofaríngeo, linha espinolaminar, alinhamento anterior e posterior do corpo e dos processos espinhosos.


O espaço retrofaríngeo normal tem até 7mm entre C2 e C3 e até 21mm entre C6 e C7. Valores aumentados possuem uma sensibilidade de 65% para lesões cervicais ocultas.


O alinhamento das linhas e a harmonia das curvas devem ser mantidos. Qualquer quebra em uma dessas linhas ou aumento de espaço entre os processos espinhosos pode representar uma lesão cervical. O aparecimento de uma cifose maior que 11° também sugere lesão ligamentar. Além disso, atenção deve ser dada a possíveis translações ou perdas de altura dos corpos vertebrais.


As radiografias anteroposteriores também são importantes para descartar lesões com componente rotacional ou angulações laterais.


Um exame radiográfico adequado deve obrigatoriamente incluir a transição C7-T1, apesar de apenas 57% desses exames o fazerem. Por esse motivo, a tomografia (TC) de coluna cervical tem sido cada vez mais utilizada para avaliação inicial do paciente politraumatizado. A TC oferece uma sensibilidade mais alta em relação à radiografia em 3 posições. Permite a visualização de fragmentos intracanais, fraturas de lâminas e pedículos. Além disso, a tomografia helicoidal permite reconstruções de alta qualidade em vários planos e são exames rápidos.


O papel da ressonância magnética na avaliação inicial do paciente vítima de trauma ainda está sendo estabelecido. Trata-se de um exame muito superior para visualização de partes moles, como os ligamentos, o disco e a medula. Sua maior utilidade está na detecção de hérnias discais traumáticas, hematomas epidurais, edema ou compressão da medula ou lesão ligamentar posterior.


Infelizmente, não é todo serviço que dispõe de tomografia e a seguinte abordagem pode ser realizada para o paciente com radiografias adequadas normais, em Glasgow 15 e com dor cervical após um evento traumático: analgesia com anti-inflamatórios e analgésicos e reavaliação após 1 hora. Se o paciente estiver sem dor em repouso e sem dor à palpação de processos espinhosos, então abrimos o colar cervical e pedimos para que o paciente faça movimentação ativa em rotação para esquerda e direita em flexão. 


O colar pode ser retirado se não houver dor após a movimentação ativa. O paciente que mantiver dor, alteração do nível de consciência ou a radiografia não for adequada deve ser mantido com colar e transferido para um centro com tomógrafo para uma melhor avaliação.

AGENDE UMA CONSULTA

Lesões cervicais altas 

Fraturas da junção crânio cervical

A base do crânio, o atlas e o áxis formam uma região anatômica denominada junção cranio-cervical. Articulações altamente especializadas e um complexo ligamentar fazem com que essa região funcione como uma unidade. Assim sendo, seu estudo merece uma atenção especial.


A coluna cervical alta é responsável por 60% da rotação no plano axial, 40% da flexo-extensão e 45% da movimentação global.


O atlas roda sobre o áxis cerca de 80° a 88°. A amplitude de flexo-extensão entre C0-C1 e entre C1-C2 é de 20 a 30°. A inclinação lateral é de aproximadamente 20° entre C1 e C2. Essa grande amplitude de movimento é o resultado de restritores ósseos de menor importância em relação a estruturas ligamentares.


Os ligamentos alares, que vão do básio ao odontóide, restringem primariamente a rotação. Em estudos em cadáver, foi observado que a secção de um ligamento alar aumenta entre 30 e 40% a flexão, rotação e inclinação lateral. O ligamento cruciforme e a sua porção que forma o ligamento transverso são importantes na movimentação entre C1 e C2, conferindo estabilidade a este segmento.


Conhecimento da anatomia regional e um alto índice de suspeita são fundamentais para um diagnóstico preciso, além de necessários para indicar o tratamento corretamente.


Fraturas do côndilo occipital

As fraturas dos côndilos occipitais são lesões raramente vistas na prática clínica. 


Atualmente, essas fraturas passaram a ser diagnosticadas com maior frequência graças ao uso em larga escala da tomografia computadorizada. A RNM tem um valor inestimável para a detecção de lesões intrínsecas da medula ou para confirmar uma dissociação cranio-cervical, evidenciando lesões ligamentares.


Essas fraturas ocorrem devido a traumatismos de alta energia e lesões associadas são muito comuns e variadas. Podemos observar fraturas da coluna cervical, principalmente C1 e C2, lesões do sistema nervoso central e lesões de outros órgãos internos. As fraturas de côndilo occipital foram divididas em 3 tipos, de acordo com a classificação de Anderson e Montesano:



As lesões classificadas como tipo I são fraturas de impacto decorrentes de cargas axiais. São caracteristicamente cominutas e estáveis devido à integridade da membrana tectorial e ligamento alar contralateral. As lesões do tipo II são identificadas pela presença de um traço de fratura oblíquo e são potencialmente instáveis. Ocorrem por um mecanismo de extensão exagerada do crânio. A fratura geralmente se estende à base do crânio além do côndilo occipital. Já as lesões tipo III resultam da avulsão ligamentar e constituem o subtipo mais frequente. São lesões instáveis e podem ser componentes da disjunção cervico-craniana. Uma fratura bilateral na inserção dos ligamentos alares é uma lesão altamente instável e corresponde a uma luxação cervico-craniana. Existe uma alta mortalidade associada a esse tipo de lesão.


Devido à raridade destas lesões, não existe um protocolo bem estabelecido de tratamento. Entretanto, o tratamento dessas lesões depende da presença ou ausência de estabilidade. O uso por 3 meses de colar cervical rígido ou halo-colete está indicado nas fraturas estáveis, tipos I e II. A cirurgia de artrodese occipito-cervical é realizada nas fraturas que possuem características que as tornem instáveis, como as do tipo III bilaterais, por exemplo.


Fraturas do Atlas

As fraturas do atlas representam 2 a 13% das lesões da coluna cervical. Raramente estão associadas a alterações neurológicas. Déficit neurológico pode existir quando há associação com uma fratura do odontóide ou lesão dos ligamentos alares ou ainda do ligamento transverso. Em 1920, Jefferson descreveu a fratura em explosão do atlas atribuindo a ela o mecanismo de carga axial ao topo da cabeça. Atualmente, são frequentemente associadas a acidentes automobilísticos.


Com a compressão de C1 sobre C2, ocorre a ruptura do atlas nos pontos de maior fragilidade. Estes locais são os arcos posterior e anterior que, quando fraturados, permitem o afastamento das massas laterais e consequente aumento da área do canal. Isso justifica a pequena associação com lesão neurológica dessas fraturas.


As fraturas do arco anterior e posterior são geralmente vistas nas radiografias de perfil, enquanto as massas laterais de C1 podem ser vistas na radiografia transoral.


Na presença de lesão do ligamento transverso, pode-se encontrar assimetria das massas articulares em relação ao odontóide. Outro indício da incompetência do ligamento transverso é visto quando a somatória da distância entre a borda lateral da massa articular de C1 e C2 do lado direito e esquerdo for superior a 6,9 mm (critério de Spence). Na radiografia em perfil, pode-se avaliar o intervalo atlanto-odontóide (IAO), que deve ter até 3 mm. Um IAO entre 3 e 5 mm sugere lesão do ligamento transverso isolado e quando maior do que 5 mm, provavelmente há lesão associada dos ligamentos alares.


A fratura é mais bem avaliada pela TC que permite a visualização de C1 no plano axial. A RNM permite a avaliação direta das estruturas ligamentares.


São classificadas por Levine e Edwards:

I - Fraturas do arco posterior, causadas por hiperextensão.

II - Fratura de massa lateral, causada por rotação ou inclinação lateral.

III - Fratura isolada do arco anterior, causada por hiperextensão com desvio mínimo, cominuída e fraturas instáveis.

IV – Explosão.


Também podem ser classificadas em estáveis e instáveis de acordo com a competência do ligamento transverso. São estáveis as fraturas isoladas do arco posterior, avulsão do arco anterior ou do anel de C1, sem associação com lesão do ligamento transverso. As fraturas instáveis são as fraturas do arco anterior com desvio posterior do atlas em relação ao odontóide e as explosões com a somatória do afastamento das massas laterais maior do que 6,9 mm (Spence), o que se traduz por lesão do ligamento transverso.


O tratamento da fratura depende da estabilidade. Nas fraturas estáveis, o tratamento geralmente é conservador, com o uso de tração e de órtese semi-rígida, ou imobilização com halo-gesso ou halo-colete por 3 a 4 meses. Estudos mostraram que as fraturas em explosão, não complicadas, possuem um afastamento das massas laterais menor do que 5,7 mm e podem ser tratadas adequadamente por estes métodos citados. Uma vantagem do tratamento conservador é a preservação da articulação entre C1 e C2 e consequentemente manutenção da amplitude de movimento normal. As taxas de consolidação e os resultados do tratamento conservador são bons.


O tratamento cirúrgico é destinado para as lesões instáveis devido ao risco de progressão dos desvios, pseudartrose (não consolidação da fratura) e em pacientes politraumatizados. São tratadas por tração prolongada com halo craniano, artrodese C1-C2 ou artrodese occipito-C2. O inconveniente de realizar uma artrodese neste nível é a grande perda de mobilidade, lembrando que 50% da rotação cervical ocorre entre C1 e C2.


Existem diversas técnicas cirúrgicas para se obter uma fusão entre C1 e C2. Elas podem envolver amarrilho entre C1 e C2, parafusos trans-articulares e parafusos pediculares e de massa lateral. O uso de enxerto consiste em uma etapa comum a todas as técnicas.


A técnica com amarrilho não é indicada quando há lesão do arco posterior, pois ele está desconectado do restante da vértebra.


Luxação e subluxação Atlanto-axial

A subluxação rotatória é mais frequente em crianças e geralmente tem pequena gravidade. Está associada a quadros infecciosos, doenças virais e na imensa maioria são quadros autolimitados. Não são, portanto, lesões traumáticas.


O adulto, por outro lado, apresenta a luxação decorrente de traumatismos, geralmente acidentes automobilísticos. O quadro clínico pode variar desde dor cervical nas subluxações até um quadro de torcicolo com flexão do pescoço para um lado e rotação da cabeça para o lado oposto. Além disso, as fraturas das massas laterais associadas são comuns.


Mais uma vez, uma suspeita clínica forte se faz necessária para o diagnóstico correto, visto que o paciente geralmente não apresenta déficit neurológico e as imagens muitas vezes são inadequadas.


A mensuração do intervalo atlanto-odontóide (IAO) é importante para a determinação da integridade do ligamento transverso. Nos adultos não deve exceder 3 mm e na criança 5 mm. Na radiografia transoral, é importante notar a presença ou não de assimetria entre as massas laterais de C1 em relação ao odontóide às massas laterais de C2. A assimetria persistente, não corrigível com a rotação da cabeça, é critério básico para o diagnóstico de deformidade rotatória fixa atlanto-axial. A tomografia é fundamental para quantificar a deformidade rotatória e é ainda melhor quando feita de forma dinâmica, com rotação de 15° para ambos os lados. A ressonância magnética é útil na identificação de lesões ligamentares associadas.


Fielding e Hawkins em 1977 foram os primeiros a agrupar essas lesões e utilizar o termo deformidade rotatória fixa para denominá-las. São lesões classificadas por esses autores em 4 tipos:


1. Deformidade rotatória fixa sem desvio anterior

Tipo mais comum e benigno, correspondendo a 47% dos casos.


2. Desvio anterior com IAO entre 3 e 5 mm

Há associação com lesão do ligamento transverso, ocorrendo em 30% dos casos. A rotação ocorre pelo desvio de uma massa lateral que roda sobre a articulação contra-lateral íntegra.


3. Desvio anterior com IAO maior do que 5 mm

Visto em pacientes com lesão do ligamento transverso e estabilizadores secundários. Há desvio anterior de ambas as massas laterais.


4. Desvio posterior constituindo

Um tipo raro, associado a processo odontóide deficiente.


O tratamento das lesões é variado e depende do tipo de lesão. As lesões rotacionais nas crianças, geralmente decorrentes de processos infecciosos, têm um curso benigno. São tratadas com medicamentos analgésicos e anti-inflamatórios e com imobilização cervical para melhora da dor. Se a subluxação persistir, tração mentoniana ou craniana é uma alternativa ao tratamento cirúrgico.


O tratamento das lesões traumáticas também pode ser conservador. A subluxação pura não raramente pode ser tratada adequadamente com tração halo craniana seguida de gesso colar cervical. Os tipos III e IV exigem, entretanto, tratamento cirúrgico com fusão de C1-C2. A técnica de colocação de enxerto posterior C1-C2, utilizada para o tratamento das fraturas de C1, é utilizada para as lesões rotatórias graves, com fusão do processo espinhoso de C1 e C2 por meio de enxerto de crista ilíaca e placa de reconstrução.


A redução dessas lesões é um procedimento delicado que exige conhecimento do mecanismo das lesões e deve ser realizada por um cirurgião com experiência em coluna cervical. As técnicas de abertura posterior ou lateral são utilizadas para a redução. A decisão sobre a escolha da técnica depende do tipo de lesão e da experiência do cirurgião.


Fratura do odontóide

As fraturas do odontóide correspondem a 9 a 15% das fraturas cervicais da população adulta. Corresponde à fratura cervical mais comum na população com mais de 70 anos.


Nos idosos, são decorrentes de traumatismos de baixa energia por quedas da própria altura. Na população mais jovem, a fratura do odontóide é resultado de traumatismos de maior energia, como acidentes automobilísticos. A fratura do odontóide está associada a movimento de flexo-extensão exagerado. A associação de lesões neurológicas varia de 2 a 27%, sendo de alta gravidade ou até mesmo fatal quando presente.


A classificação de Anderson e D’Alonso, proposta em 1970, é a mais aceita e difundida. 


A fratura é dividida em 3 tipos:


I - Fraturas perto do topo;

II - Fraturas junto à base;

III - Fraturas envolvendo o corpo de C2.


As fraturas do tipo I, perto do topo do odontóide, ocorrem acima do ligamento transverso. Geralmente ocorrem por avulsão ligamentar pelo ligamento apical ou alar. São lesões infrequentes e geralmente são estáveis.


As fraturas do tipo II ocorrem entre o ligamento transverso e o corpo do áxis, sem extensão para as facetas articulares de C2. É o tipo mais comum e é relativamente instável. Ocorrem numa região de menor vascularização e estão associadas a um maior risco de pseudoartrose.


O tratamento das fraturas do tipo II pode ser feito de forma conservadora ou cirúrgica. Além do padrão da fratura, é importante considerar as condições clínicas do doente para a decisão do tipo de tratamento mais adequado.


O tratamento conservador pode ser feito através da imobilização externa com órtese cervicotorácica rígida, gesso do tipo minerva ou halo-colete. Com o tratamento conservador, o risco de pseudoartrose varia de 26 a 80% na literatura. Esse risco elevado de pseudoartrose é atribuído a uma instabilidade da fratura.


Os fatores de risco para pseudoartrose são desvio inicial maior do que 4 a 6mm, angulação maior do que 10.º, retardo no diagnóstico e idade acima dos 40 a 65 anos. Os doentes com fatores de risco significativos para pseudoartrose podem ser tratados com maior segurança de forma cirúrgica.


Como opção, nos doentes com traço de fratura favorável, pode-se fazer a osteossíntese com o uso de parafuso interfragmentário pela via anterior.



Essa técnica permite a preservação da rotação entre C1 e C2 e se o ligamento transverso for competente, não há necessidade do arco posterior de C1 estar intacto, como nas técnicas que utilizam amarrilhos posteriores para artrodesar C1 e C2. A via de acesso anterior é mais anatômica e essa técnica dispensa a necessidade de enxerto de crista ilíaca, o que reduz a morbidade pós-operatória. Os resultados referentes à consolidação da fratura com o uso do parafuso interfragmentário variam de 83 a 100%.


Esta técnica não é indicada para fraturas irredutíveis por métodos fechados e lesões crônicas. Idosos com osteoporose e fraturas patológicas também constituem contraindicações. Em alguns casos, a fixação não é tecnicamente possível pelas características do traço de fratura.


No intuito de guiar a indicação desta técnica, Grauer e colaboradores dividiram as fraturas do tipo II em 3 subtipos conforme a morfologia do traço de fratura. O tipo IIA refere-se às fraturas sem desvio. O tipo IIB corresponde a fratura com desvio que corre de ântero-superior para postero-inferior ou uma fratura transversa. Este subtipo é considerado favorável e permite o uso do parafuso interfragmentário pela via anterior. O tipo IIC desta classificação corresponde a um traço de fratura que vai de antero-inferior para postero-superior ou existe cominuição significativa. Este tipo não pode ser tratado de forma satisfatória através da fixação.

Nos casos em que a osteossíntese não é recomendada, a fratura pode ser tratada com artrodese entre C1 e C2 pela via posterior, com a desvantagem da perda de grande parte da rotação.


A fratura de odontóide do tipo III da classificação de Anderson e D’Alonso apresenta um traço de fratura que se estende pelo corpo de C2. É mais estável do que as fraturas do tipo II e possui um bom aporte sanguíneo. Na maior parte dos casos, as fraturas do tipo III podem ser tratadas por imobilização externa.


Espondilolistese traumática do axis

A espondilolistese é o segundo tipo mais frequente de fratura de C2 (38%), sendo um tipo comum de lesão fatal.


O termo “fratura do carrasco” foi atribuído a esse tipo de fratura em virtude de sua associação com vítimas de enforcamentos. Sabe-se que existe bastante diferença entre uma fratura por enforcamento e outra devido a um acidente automobilístico, atualmente a principal causa deste tipo de lesão.


Diferenças em relação ao mecanismo de trauma, lesão de tecidos moles, prognóstico e características clínicas são observadas, apesar do padrão radiográfico parecido.


O áxis é uma vértebra única com características anatômicas peculiares. Seus pedículos alongados são as partes mais fracas do anel ósseo. O anel de C2 também é “enfraquecido” pelos forames transversários. Dessa forma, forças de flexo-extensão produzem um fulcro capaz de lesionar caracteristicamente esta região, produzindo a espondilolistese de C2. A fratura pedicular aumenta o diâmetro do canal e, dessa forma, lesões neurológicas são raramente encontradas nos sobreviventes. Uma incidência de 6 a 10% de lesão neurológica é observada nos pacientes com espondilolistese traumática do áxis. A lesão neurológica ocorre principalmente quando um fragmento do corpo se desloca dorsalmente para dentro do canal. Essa lesão deve ser reconhecida pelo potencial dano neurológico que ela carrega.


É fundamental procurar por lesões associadas. Em um terço dos pacientes, iremos encontrar outra fratura na coluna vertebral, principalmente nas 3 vértebras cervicais proximais. O diagnóstico dessas lesões pode ser estabelecido através de radiografias simples.


A classificação de Effendi modificada por Levine e Edwards foi elaborada a partir de radiografias em perfil e é útil para traduzir o mecanismo de lesão. O espaço discal entre C2 e C3 e as articulações facetárias são analisados e traduzem informações importantes. O grau e o tipo de desvios dos fragmentos anterior e posterior são levados em consideração.


I - Fraturas sem desvio angular e com translação não maior do que 3 mm. O disco entre C2 e C3 é normal e estável.


II - Fraturas com desvio tanto angular quanto translacional


IIA - Fraturas com angulação acentuada, mas pouca ou nenhuma translação


III - Fratura com desvios graves e com luxação uni ou bifacetária ao nível e C2 C3.



O tipo I, de maior estabilidade, não apresenta lesão discoligamentar entre C2 e C3 como os tipos II, IIA e III. O mecanismo de lesão envolve hiperextensão e carga axial. Lesões neurológicas são muito raras, porém deve-se dar atenção a possíveis fraturas associadas. O tratamento empregado consiste no uso de colar cervical rígido tipo Filadélfia por 12 semanas ou halo craniano. Esse tratamento proporciona altas taxas de consolidação.


As fraturas tipo II são frequentemente associadas a fraturas por compressão de C3 e existe uma força em flexão em seu mecanismo. O disco e o ligamento longitudinal posterior são lesados. O tratamento também é conservador na maioria das vezes. O halo craniano é utilizado inicialmente para redução e se esta for obtida, um halo-colete pode ser empregado. Angulação de até 15° e desvios de 4mm são aceitáveis.


As fraturas instáveis ou irredutíveis podem ser tratadas cirurgicamente. Artrodese anterior entre os corpos de C2 e C3 consiste em uma boa opção. Discectomia e a utilização de uma placa fornecem um bom resultado e preservam o movimento entre C1 e C2.


As fraturas tipo IIA apresentam uma deformidade cifótica com abertura do espaço entre C2 e C3. A tração pode piorar essa lesão. O ligamento longitudinal anterior é por vezes a única estrutura intacta entre C2 e C3.


As lesões tipo III apresentam luxações facetárias uni ou bilaterais e são instáveis, necessitando de tratamento cirúrgico. O mecanismo de trauma envolve forças de compressão em flexão, produzindo falha nos pedículos que se estende anteriormente. As opções incluem artrodese posterior de C1 a C3, artrodese posterior entre C2 e C3 utilizando parafusos interfragmentares em C2 e uma abordagem anterior com fusão dos corpos vertebrais de C2 e C3.


AGENDE UMA CONSULTA

Lesões cervicais baixas

As lesões cervicais baixas ou subaxiais são aquelas que acometem de C3 a junção cervicotorácica (C7-T1). As vértebras desse segmento são as menores da coluna cervical e guardam entre si características anatômicas semelhantes. O corpo vertebral é maior no sentido transversal do que no sentido anteroposterior, a superfície do platô vertebral superior é côncava e delimitada bilateralmente pelos processos unciformes que se articulam com a vértebra acima, formando as articulações de Luschka. Já a superfície inferior do platô vertebral é convexa. O canal vertebral apresenta forma triangular. 


Os processos espinhosos são curtos e bífidos, sendo que o de C7 é o mais proeminente. O processo transverso é uma projeção do corpo vertebral bilateralmente, onde se localiza o forame da artéria vertebral. Na grande maioria dos casos, o forame de C2 a C6 contém a artéria vertebral, enquanto o forame de C7 não contém. Ainda em relação ao processo transverso, este contém o chamado tubérculo anterior, que é uma estrutura de inserção muscular. Sendo que na vértebra C6, este se encontra facilmente palpável, recebendo o nome de tubérculo de Chassaignac. 


Entre cada vértebra, existem os chamados forames de conjunção, por onde emergem as raízes cervicais, que se localizam logo atrás da artéria vertebral. Cada vértebra conta ainda com duas massas laterais posteriores e quatro superfícies articulares. As superfícies estão anguladas em 45 graus com a horizontal, duas direcionadas para cima e para trás e duas direcionadas para baixo e para frente.

As massas laterais são comumente usadas para passagem de parafusos para síntese de coluna cervical. Existem diversas técnicas de colocação destes parafusos, entre as mais importantes estão Magerl e Roy Camille. Já os pedículos das vértebras da coluna subaxial são muito estreitos de C3 a C6, sendo que a instrumentação pedicular nestes níveis não é segura. Já na vértebra C7, a massa lateral é estreita, e deve se dar preferência à fixação no pedículo.


Em relação às estruturas ligamentares, estas são semelhantes às encontradas no restante da coluna vertebral. Na parte anterior ao corpo vertebral, encontra-se o ligamento longitudinal anterior; na parte posterior, encontra-se o ligamento longitudinal posterior; e entre os processos espinhosos, posteriormente aos elementos nervosos, encontra-se o ligamento amarelo. Existe ainda o ligamento interespinhoso entre os processos espinhosos e a cápsula articular das facetas.


Na coluna cervical baixa ocorrem movimentos de rotação, flexoextensão e inclinação lateral, sendo que o segmento mais móvel na flexoextensão é o C5-C6. O centro do movimento de cada vértebra cervical encontra-se na parte inferior da vértebra distal, sendo assim, com a flexão cervical pode ocorrer uma anterolistese fisiológica entre as vértebras, que normalmente varia de 1,5 a 2 mm. Em relação à biomecânica, 80% da carga em flexão está concentrada nos corpos vertebrais e discos, enquanto que 20% é concentrada nas facetas.


A medula espinhal é mais delgada no sentido sagital do que coronal e encontra-se espessada no território de C3 a C6. Ocupando cerca de 50% do canal acima de C5 e chegando a 70% no nível C6-C7. As raízes nervosas emergem acima do nível ósseo adjacente, ou seja, a raiz de C3 emerge acima da vértebra C3, a única exceção é a raiz de C8 que emerge abaixo da vértebra C7.


Classificação

Diversas classificações foram elaboradas para descrever as lesões cervicais e guiar o tratamento. A classificação proposta pelo grupo AO nos parece a mais adequada.


As fraturas são divididas em 3 tipos básicos (A, B, C). As fraturas do tipo A correspondem às fraturas por compressão, as fraturas do tipo B são as lesões por distração e as do tipo C apresentam um componente rotacional.

As fraturas em compressão, do tipo A, são subdivididas em 3 tipos: A.1 – impactação, A.2 – separação ou “split” e as lesões A.3 – explosão. A diminuição da altura do corpo e sua fragmentação são características compartilhadas por essas lesões.


As fraturas do tipo B, por distração, são divididas em B1 – lesão posterior com corpo íntegro, B2 – lesão posterior associada a fratura do corpo do tipo A e B3 – distração anterior, hiperextensão. Essas lesões têm como característica a lesão ligamentar, sendo ela posterior nos tipos B1 e B2 e anterior no tipo B3.


As fraturas com componente rotacional, do tipo C, são caracterizadas por um componente rotacional. A fratura-luxação facetária unilateral constitui o tipo C.1. O tipo C.2 consiste na luxação facetária unilateral e o tipo C.3 consiste na fratura da massa lateral que pode estar associada a lesão do tipo A ou B.


O conceito principal em relação às lesões da coluna cervical é o de estabilidade. Lesões ditas estáveis são passíveis de tratamento conservador e lesões ditas instáveis necessitam de tratamento cirúrgico. A instabilidade a flexão está relacionada à lesão ligamentar posterior (ligamentos supraespinhoso, interespinhoso e amarelo) e lesão anterior do corpo vertebral. A instabilidade posterior está relacionada à lesão do ligamento longitudinal anterior e pedículos vertebrais. A instabilidade em rotação com a lesão do disco vertebral, ligamentos capsulares.


Os critérios radiográficos para determinação de instabilidade são realizados com Rx dinâmico em perfil. São eles: angulação maior que 11 graus entre os corpos vertebrais adjacentes e deslizamento maior que 3,5 mm entre os corpos adjacentes proximal a C4 e maior que 2 mm distal a C4. Porém, no Rx estático, também é possível verificar se há instabilidade. No Rx em AP, as lesões instáveis são aquelas com desvio rotacional dos processos espinhosos ou aquelas com alargamento dos processos espinhosos; já no Rx em Perfil são aquelas com fraturas com redução da altura de mais de 25%, alargamento da superfície articular com mais de 1,7mm, e rotação das facetas articulares. Qualquer luxação ou subluxação (quebras das linhas de continuidade da coluna) obviamente é considerada uma lesão instável.


No Rx em perfil é possível inferir quando a luxação é unifacetária ou bifacetária. Quando houver deslocamento entre os corpos menor que 50%, trata-se de uma luxação unifacetária, quando houver deslocamento maior que 50%, trata-se de uma luxação bifacetária.



AGENDE UMA CONSULTA

Tratamento para a fratura da coluna cervical


Lesões Tipo A

A1 – Impactação

Fraturas tipo impactação são estáveis e devem ser tratadas com órtese ou colar cervical rígido por 12 semanas.


A2 – Separação (Split)

Fraturas do tipo Split podem ser instáveis ou estáveis, podendo ser tratadas tanto de maneira conservadora quanto cirúrgica, conforme a estabilidade. Redução com halo craniano se necessário e posterior tratamento com halo-gesso ou órteses sob molde por 12 semanas consistem no tratamento das lesões estáveis. A opção cirúrgica, para lesões instáveis, consiste em corpectomia parcial por via anterior e estabilização com enxerto ósseo estruturado ou cage e placa cervical. A decisão deve ser tomada com base nas condições clínicas do paciente, preferência do cirurgião e critérios de instabilidade já citados. Pacientes com lesão neurológica, em geral, são tratados de maneira cirúrgica com descompressão do canal associada.


A3 – Explosão

Fraturas do tipo Explosão podem também ser tratadas de maneira conservador em um paciente sem déficit desde que não haja sinais de instabilidade. Em geral é usado halo craniano para redução e halo-gesso ou minerva por 12 semanas até o término do tratamento. Já em um paciente com sinais de instabilidade (compressão maior que 25%) ou lesão neurológica deve-se considerar o tratamento cirúrgico por via anterior com corpectomia e estabilização com enxerto estruturado ou cage e placa cervical. 


Esse tipo de lesão não deve ser tratado com a estabilização posterior isolada.


Obs.: quando for necessário a utilização de tração com halo craniano deve-se usar na redução 4,5 kg mais 2,3 kg por cada segmento de vértebra de C1 até o nível da lesão progressivamente para se obter a redução. No máximo, pode ser utilizado 15 kg e deve-se fazer um controle clínico rigoroso, baseado na frequência cardíaca, reparatória, exame neurológico e presença de nistágmo. Esse controle deve ser feito a cada aumento de peso, até que a redução seja alcançada. Após alcançada a redução o excesso de peso deve ser retirado e o paciente deve ser mantido com 4,5 kg.


Lesões tipo B

B1 – Lesão dos elementos posteriores com corpo vertebral integro

Estas lesões são instáveis e podem variar de um pequeno aumento na distância dos processos espinhosos no Rx até a luxação bilateral das facetas com ou sem fratura das mesmas. 


A utilização de RNM com imagem sagital pesado em T2 com supressão de gordura pode auxiliar no diagnóstico das lesões mais sutis. No caso de inviabilidade da RNM  pode-se iniciar tratamento conservador desta lesões e acompanhamento com Rx dinâmico. 


Nos casos em que uma instabilidade for identificada indica-se cirurgia.  Nas lesões sem a presença de luxação propriamente dita a cirurgia fica indicada, podendo ser feita pela via posterior ou anterior. Na presença de luxação indica-se redução com halo craniano e posterior artrodese. Quando a redução não for obtida com o halo craniano e tração deve-se realizar uma abordagem cirúrgica para tal. A abordagem posterior é mais fácil para obter a redução. No entanto existe o risco de ocorrer uma herniação do disco para dentro do canal no momento da redução. 


A via anterior é considerada mais segura, por ser possível realizar discectomia antes de proceder à redução. Entretanto a redução é mais difícil. Outra opção consiste tanto anterior quanto posterior na abordagem.


B2 – Lesão ligamentar posterior associada a fratura do corpo vertebral

São lesões instáveis e devem ser tratadas de maneira cirúrgica. O tratamento, no entanto, depende da extensão da lesão do corpo vertebral. A abordagem anterior é indicada quando a reconstrução da coluna anterior é necessária em geral em fraturas tipo explosão em que o suporte anterior está comprometido. Já a abordagem posterior pode ser realizada quando o corpo, apesar de fraturado, é capaz de suportar cargas fisiológicas.


B3 – Lesão em Hiperextensão

São lesões menos frequentes, tem diagnóstico difícil, pois pode haver redução espontânea. Nos casos em que não houver fraturas, ou luxações, somente lesão do ligamento longitudinal anterior e disco intervertebral o tratamento conservador com colar sob molde pode ser usado. Espera-se que ocorra uma anquilose espontânea entre os níveis. Já nos casos com fraturas e luxações o tratamento cirúrgico deve ser empregado. Em geral preferimos artrodese anterior com placa.


Lesões Tipo C

C1 – Fratura luxação facetária unilateral

Deve ser reduzido através do uso de halo craniano e após o tratamento conservador é há escolha.


C2 – Luxação facetária unilateral

Assim como a fratura tipo C1, a redução com halo e o tratamento conservador através de colete sob molde é a escolha.

Nota-se que tanto nas fraturas C1 como C2 a lesão ligamentar posterior é mínima diferentemente dos casos de fratura tipo B. Entretanto, quando não for obtida redução satisfatória, o tratamento cirúrgico deve ser empregado tanto para as lesões C1 quanto para as C2.


C3 – Fratura separação do maciço articular

Podem ser lesões isoladas ou associadas as lesões tipo A ou B.


São lesões instáveis e deve ser realizado tratamento cirúrgico. Neste caso também damos preferência para via anterior.



AGENDE UMA CONSULTA

Sobre o Profissional

Dr. Ivan Dias da Rocha


Ortopedia e Cirurgia da Coluna | CRM-SP 108277 RQE: 102191


Graduado em medicina pela USP São Paulo, Dr. Ivan fez residência médica e especialização em cirurgia da coluna no Hospital das Clínicas (Instituto de Ortopedia).


Possui mestrado com ênfase no tratamento de dor pela mesma instituição e fez mais de 20 cursos fora do país relacionados à área de cirurgia de coluna. 


Além disso, é pós-graduado em dor no Hospital Albert Einstein e fez curso de intervenções guiadas por ultrassom também no Hospital das Clínicas.


Atualmente está fazendo pós-graduação em medicina regenerativa na Orthogen e atua como médico do grupo de coluna do Hospital das Clínicas.

Conheça o Dr. Ivan
Share by: